quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

"A tutela tem-se comportado como um 'grande chefe' das escolas"

Num Blog que fala sobre Qualidade de Vida e Saúde (corpo, mente e empresarial), a Educação com certeza tem uma palavra a dizer.

Deixo-vos com um excelente artigo do Prof. Adão da Fonseca (clique aqui para lê-lo na íntegra), do qual destaquei os seguintes trechos:

"(...) as famílias e os alunos devem ter o direito de escolher as escolas e que os estabelecimentos de ensino preteridos devem sofrer as consequências, ou seja, fecharem as portas.(...) o Ministério da Educação deveria concentrar-se na definição de políticas de longo prazo e medir o desempenho dos professores a partir dos seus contributos para as aprendizagens dos alunos.

"O problema é que a tutela insiste em considerar que o sistema educativo é como uma grande empresa e vê-se a si própria como o conselho de administração de uma grande empresa em que os professores são meros empregados", refere.
(...)
Mas as escolas não podem escolher os alunos. Quando a procura de uma determinada escola for superior às vagas, a selecção tem de ser feita por "lotaria", depois de se aplicarem as prioridades em função da vizinhança, presença de irmãos, etc. Ora a liberdade de escolha da escola não acontece em Portugal, com os sucessivos governos a fazerem letra morta do que obriga a CRP. É uma vergonha! Tem-se mesmo vindo a recuar neste desiderato, depois de alguns avanços feitos nas décadas de 80 e de 90.
(...)
Em última análise, para o FLE, é irrelevante saber quem é o dono da escola; o que interessa é o serviço prestado e os pais têm de ter o direito de escolher, com o financiamento do Estado a ser canalizado para a escola que cada um escolhe.

E: Defende também a autonomia das escolas para desenvolverem os seus projectos. As políticas educativas caminham nesse sentido?
FAF: Claro, sem autonomia, não pode haver liberdade de ensinar. E, sem liberdade de ensinar, não há liberdade de aprender. Em suma, não há liberdade de educação. Mas a liberdade só é verdadeira liberdade e não libertinagem quando há responsabilização. Por isso, as escolas que não sejam escolhidas pelos alunos e suas famílias têm de arcar com as consequências, fechando se as famílias preferirem outras escolas.

O que vemos em Portugal não é a verdadeira autonomia. É apenas delegação de poderes de 5 de Outubro, sendo a delegação de poderes "negociada" entre o Ministério e as escolas. Ora a autonomia não se negoceia; exerce-se e responde-se por ela.

É importante termos bem presente que as conclusões do PISA mostram que os sistemas educativos com melhor desempenho são aqueles em que as escolas têm grande liberdade de desenhar os currículos, as aprendizagens são medidas e os professores são directamente contratados pelas escolas. Aplicando ao caso português, isso significaria redefinir os contratos de associação existentes com as escolas privadas e alargar os contratos de associação também às escolas do Estado, cabendo ao Ministério da Educação ser garante da qualidade de educação para todos e, finalmente, "juiz" e não "réu em causa própria".

(...) o desempenho dos professores em função do valor acrescentado na aprendizagem de cada aluno. É o incremento nos conhecimentos e competências dos alunos que passa a ser a medida mais importante do desempenho dos professores. Em Portugal temos um sistema de avaliação que dispersa a medição por um leque de metas que uns "iluminados" entendem ser importantes, conforme a moda em vigor ou que pretendem tornar o professor num mero transmissor das orientações dos "grandes chefes" da estrutura do Ministério da Educação. As orientações podem ser bem intencionadas mas não deveriam ser tomadas centralmente e iguais para todas as escolas.

E: Qual, na sua opinião, a melhor e a pior medida que a tutela tomou na área da educação?
FAF: A tutela tem-se comportado como um "grande chefe" das escolas. Enquanto tal, muitas medidas até são bem intencionadas, como disse. O problema é que a tutela insiste em considerar que o sistema educativo é como uma grande empresa e vê-se a si própria como o conselho de administração de uma grande empresa em que os professores são meros empregados. Ora o Ministério deveria limitar-se a tratar das grandes orientações de política educativa, incluindo a medição das aprendizagens dos alunos, deixando a cada escola a liberdade e a responsabilidade pelo uso dessa liberdade.
(...)
E: Refere que os ministros da Educação se têm transformado em super-chefes da gestão das escolas. Um esforço que, segundo diz, está condenado à partida. O que é necessário mudar?
FAF: A energia e a capacidade dos ministros da Educação deveriam estar focalizadas na definição das políticas educativas de longo prazo, na determinação do esqueleto essencial dos currículos e das metas da qualidade do ensino, medindo o desempenho dos professores a partir do seu contributo para as aprendizagens dos alunos, tendo sempre como primeira preocupação os que mais precisam de ajuda de todos nós, que são os mais débeis cultural, social e economicamente. Mas o que é que vemos? Vemos um ministério da gestão das escolas, tal qual o grande chefe do sistema educativo. Porque é que não aprendem com outros países? Basta um exemplo: o Ministério da Educação da Suécia tem apenas cerca de 120 pessoas.

E: Considera que o Governo deveria cortar o financiamento às escolas que demonstrem não ter capacidade de prestar um serviço de qualidade. Como se poderia fazer esta avaliação e como proteger os alunos afectados? Isso poderia acontecer no nosso país?
FAF: Sejamos claros! As escolas existem para os alunos e não independentemente de existirem ou não alunos. Ora não deve haver financiamento nas escolas onde os alunos não recebem educação de qualidade ou os alunos (e as suas famílias) não querem frequentar. Todos percebem por que é que é necessário o financiamento do Estado; é que o exercício do direito à educação exige o dispêndio de recursos económicos. Se não for o financiamento do Estado - com o dinheiro dos impostos cobrados aos cidadãos - muitas crianças e jovens ficam sem acesso a esse direito. Mas quem é que tem de ser financiado? Quem precisa, que são as crianças e os jovens (isto é, as famílias) e não as escolas!

O Estado entrega o dinheiro às escolas e não às famílias (para entregarem às escolas) porque é mais fácil sob o ponto de vista administrativo. Mas o objectivo é entregar às famílias! Perder a noção do verdadeiro objectivo do financiamento do Estado explica que muitos pensem que o apoio está a ser dado às escolas e não às famílias.

A avaliação das escolas deve ser feita pelo Estado, em nome dos cidadãos que pagam os impostos, e pelos alunos (pelas famílias). A avaliação pelo Estado tem fundamentalmente a ver com a avaliação do desempenho dos professores, medido pelo seu contributo para as aprendizagens dos alunos, como já referido. A avaliação das famílias deve ser feita através da liberdade de aprender e de ensinar, em que os pais e os alunos escolhem a escola ou até se juntam, sós ou com professores ou como quiserem, e criam novas escolas.
(...)
Vale a pena referir que um estudo recente veio demonstrar que a segregação surge quando as escolas têm possibilidade, legal ou de facto, de seleccionar os alunos, e não quando é reconhecido aos pais e encarregados de educação o direito de escolherem a escola para os seus educandos. Especialmente significativo é o facto de o mesmo estudo concluir que a liberdade de escolha da escola aumenta de forma inequívoca o desempenho das escolas. Pelo contrário, a escolha dos alunos pelas escolas induz um efeito de estratificação, com os alunos menos aptos ou com maiores dificuldades a serem atirados para as escolas menos desejáveis e produtivas. Por isso, o FLE defende que os pais devem ter liberdade de escolha da escola, mas as escolas que prestam serviço público de educação não devem poder escolher os alunos. E, quando a procura exceder a oferta de lugares, a inscrição deve ser feita por lotaria, sem esquecer as prioridades habituais que têm a ver com a vizinhança, presença de irmãos e outras que já são comummente aceites.

(...) Saímos da cauda da tabela, embora continuemos abaixo da média europeia. Mas tenhamos presente que a média é a ambição dos medíocres. Estarmos na média não nos serve. Não serve o futuro das nossas crianças e jovens. Não serve o futuro de Portugal. Nós temos de estar acima da média. Por isso, o que precisamos agora é de analisar os resultados com seriedade e retirar lições dos países que melhoraram de forma rápida para níveis acima da média.

E: O Orçamento do Estado estipula cortes na educação. Preocupado com esta crise que também mexerá com os investimentos no sector educativo?
FAF: Sim, claro. Mas não entendemos que os cortes sejam feitos nos apoios às famílias (como acontece nos contratos de associação, nos contratos simples e noutros e nos cortes nas escolas públicas). Outros países preferiram fazer os cortes na estrutura administrativa e nos gastos do Ministério da Educação. Mas pensamos também em alguns gastos despropositados feitos nos dois últimos anos pela sociedade "Parque Escolar" e em certas obras públicas cuja rentabilidade é claramente negativa, embora o "martelamento" dos números permita enganar o povo português.
(...)"

Abraços saudáveis

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