domingo, 6 de setembro de 2009

"O cultivo da coragem"


Mais um excelente artigo (clique aqui para lê-lo na íntegra) publicado pela jornalista Cristiane Segatto, digno de ser partilhado com os meus leitores.
Aqui ficam alguns trechos elucidativos do seu conteúdo:

"Sinto uma enorme atração por um certo cientista. Ele tem 85 anos, (...) seu nome é Paulo Vanzolini.
(...)
Na carreira paralela, Vanzolini é autor de músicas muito conhecidas. As principais são “Ronda” e “Volta por cima”. Adoro a mensagem inspiradora que esse samba nos oferece:

“...Reconhece a queda e não desanima
Levanta, sacode a poeira
E dá a volta por cima”
(...)
Estava no cinema um dia desses e vi um trailer do filme. O que me cativou foi o julgamento que o sambista faz sobre “Volta por cima”, sua música mais famosa.

“Ela tem um fracasso”, diz Vanzolini. “Ninguém entendeu que o importante não é dar a volta por cima. É reconhecer a queda”.

Fui para casa com Vanzolini na cabeça. Como é importante reconhecer a queda! E como é impressionante perceber que pouca gente consegue fazer isso.

Das pessoas que você conhece, quantas são capazes de dizer “Errei”? Quantas assumem isso publicamente? Quantas reconhecem o fracasso? A decadência. A queda.

Reconhecer a queda é o primeiro passo para se recuperar. Para aprender com os erros e seguir em frente. Conversei sobre isso nesta semana com o psicólogo Julio Peres. Ele fez pós-doutorado no Centro de Espiritualidade e Mente da Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos. Está lançando o livro Trauma e Superação: O que a psicologia, a neurociência e a espiritualidade ensinam.

Um dos capítulos do livro se chama Dar a Volta por Cima. É um sinal de que a expressão eternizada por Vanzolini está grudada nos nossos corações e mentes. Virou patrimônio nacional.

Resiliência é um outro termo que expressa essa capacidade de recuperação. Vem da Física e se refere à capacidade que um corpo tem de sofrer uma deformação pela ação de um agente externo. E depois voltar à forma natural.

Quando damos um soco com toda força num travesseiro, depois de um tempo ele retorna à forma original sem sofrer grandes estragos. Algumas pessoas têm mais resiliência emocional. São as que reconhecem a queda e dão a volta por cima. Mas a resiliência é uma qualidade que pode ser aprendida.

Segundo Peres, há alguns fatores que favorecem essa capacidade. São mais resilientes as pessoas que:

· acreditam em si mesmas e na capacidade de influenciar as pessoas com quem convive

· conseguem tirar lições de eventos positivos e também dos negativos. “São pessoas que constroem um aliança de aprendizado com a adversidade”, diz Peres

· são cooperativas. Não estão focadas apenas no próprio bem-estar, mas nos benefícios que podem trazer aos que estão por perto

· têm espiritualidade. Não se sentem sozinhas

Como assim? Isso quer dizer que os ateus não podem ser resilientes? Não é bem isso. “O sujeito pode ser ateu e, mesmo assim, não se sentir desamparado”, diz Peres. “Quem se sente amparado supera os traumas mais facilmente”, diz.

Quando sofrem um trauma, as pessoas se sentem covardes em relação ao evento que o produziu. Quem sofre um grave acidente de trânsito, resiste a entrar em um carro novamente. Quem é traído pelo melhor amigo resiste a criar laços duradouros. “Quem passa pela dor, costuma ficar em silêncio”, diz Peres. “O silêncio potencializa o trauma”.

Falar. Contar e recontar a história ajuda o sofredor a amenizar a ansiedade e substitui-la por coragem. Quando a pessoa conta a história pela primeira vez, a narrativa é toda carregada das sensações pesadas que ela sofreu. Conforme conta e reconta, a carga emocional vai sendo amenizada.

“Devemos contar a história tão bem quanto possível”, afirma Peres. “É muito importante contá-la a quem possa ouvir sem fazer julgamentos”, afirma. Se a pessoa não tiver acesso a um psicoterapeuta, deve contar a história a um familiar, um amigo, um líder religioso.

Em 2007, Peres publicou um interessante estudo sobre os efeitos neurobiológicos da psicoterapia. O trabalho saiu no periódico científico Journal of Psychological Medicine. Dezesseis pacientes que haviam sofrido algum tipo de trauma foram divididos em dois grupos. Um deles foi submetido a sessões de psicoterapia. O outro, não.

Estudos de neuroimagem realizados no início do estudo e dois meses depois revelaram importantes diferenças. O cérebro das pessoas que fizeram terapia apresentavam mais atividade no córtex pré-frontal. Essa área está envolvida na classificação das experiências. É a região que nos faz atribuir significado ao que vivemos.Verificou-se também menos atividade na amígdala, a área do cérebro relacionada à expressão do medo.

Enquanto conversava com Peres, comecei a pensar nas pessoas que sofrem de estranhas fobias e nas formas de tratamento que podem ajudá-las. Uma delas é a terapia cognitivo-comportamental. Por meio de várias técnicas, a pessoa é exposta, aos poucos, à situação que lhe assusta. Quando ela percebe que nada de mal lhe acontece, sua ansiedade diminui. Está aberto o caminho da superação.

Vanzolini não sabe. Mas ele também me ajudou nisso. Há oito anos, resolvi entrevistá-lo. Para passar algumas horas ouvindo as histórias dele eu teria de pagar um alto preço: enfrentar meu pavor de cobras. Resolvi apostar, mas não imaginava que a experiência seria tão marcante.
(...)"

Todos nós damos as nossas quedas na vida e este artigo, é uma luz sobre como agir nesses momentos, para minimizarmos os impactos negativos e maximizarmos a probabilidade de voltar à superfície no mais curto espaço de tempo e, se possível, em melhores condições para enfrentar os próximos desafios.

Abraços saudáveis

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