domingo, 1 de fevereiro de 2009

"(...) sempre fenomenal Dom João!"


Li recentemente o seguinte testemunho de um ex-colega meu:

"Nos meus check-ups anuais, que marcava com toda a assiduidade, estava à espera que o médico detectasse alguma doença que explicasse o que eu sentia. Mas nada. Tudo estava sempre fenomenal Dom João. (...) Se não tinha nada no coração, se a minha cabeça estava óptima se os pulmões estavam a aguentar tão bem o tabaco que tinha voltado a fumar (...), se os intestinos aguentavam os dias em que não conseguia ir à casa de banho, então para quê tentar explicar-lhes que me sentia de forma corrente numa situação de tal ansiedade.
Saía dos exames médicos e sabia que os Lexotans me iriam ajudar. Ao médico sempre lhe disse que tomava esses remédios para o stress e ele achava muito bem, pois isso já faz parte da vida dos executivos. É um complemento do fato e gravata. Assim, havia que nunca esquecer esses velhos amigos. Já lá iam dez anos que viviam comigo e eu com eles. Aqueles amigos cor-de-rosa que sempre me acompanhavam para todo o lado. Andavam sempre no meu bolso ou na minha pasta. Mas porque não me faziam o efeito desejado? Porque só me acalmavam por algumas horas? Vim a saber , quase onze anos mais tarde, que não eram a cura para o meu mal. Ataques de pânico não se curam com esse tipo de medicação."

Como é possível que um médico possa dizer a um paciente como este meu amigo, que "tudo estava sempre fenomenal Dom João"?

Esquecendo agora a questão específica dos ataques de pânico, será que alguém que fuma, com intestinos que aguentam dias sem ir à casa de banho, etc, pode estar "fenomenal"?

E por último, como pode um profissional da saúde (ou será da doença?!), achar "muito bem"que os executivos usem regularmente Lexotans, porque "isso já faz parte da vida" deles, tal como o fato e gravata?

Não são conselhos destes ou omissões que considero graves, que espero do "meu" médico!

Abraços saudáveis

2 comentários:

Anônimo disse...

Provavelmente porque este médico era especialista e não generalista... ou porque, sendo os exames normais, não conseguia detectar nenhuma patologia orgânica que pudesse tratar... e mesmo identificando a outra patologia - neste caso a ansiedade e todos os restantes problemas resultantes de somatização, considerava que não conseguiria mudar o ritmo de vida do tal executivo, logo mais valia tomar a medicação... Até porque se disser ao doente que é tudo da sua cabeça ou é o seu corpo a dar sinal, os doentes dizem logo que o médico é que não consegue descobrir o problema... e se o doente não quiser ou não puder mudar o seu estilo de vida, de que adianta? Vai acabar na mesma por tomar medicação... oK, agora sabe que afinal eram ataques de pânico mas no fundo acabou por os tratar na mesma com igual medicação. Isto para dizer que um médico não pensa apenas no diagnóstico, mas naquilo que tem para oferecer quando não há diagnóstico... lidar com a somatização é um dos problemas mais difíceis e mais angustiantes para médicos e doentes... o resultado é sempre sensação de frustração!

João Marques disse...

Agradeço o seu comentário, concordo consigo que não é fácil, mas por isso mesmo, temos que estudar, praticar, unir o conhecimento técnico ao eterno Bom Senso, etc.

E o médico tem que fazer a parte dele, mesmo com a resistências dos seus pacientes, mas desistir de fazer o que considera certo por pensar que os pacientes não vão ter a disciplina e ou força de vontade para melhorarem os respectivos estilos de vida, é seguir o caminho mais fácil e com menores resultados positivos.

E finalmente é um grande erro validar algo como "Lexotans, fazem parte da vida dos executivos. É um complemento do fato e gravata."
Temos que conseguir encontrar fórmulas que façam esses executivos (e não só!) a pararem um pouco e darem o devido valor ao seu "património saúde".

Abraços saudáveis,

João Marques Carvalho